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VOTO NA URNA

Militância deve observar pesquisas, mas mobilização popular é decisiva para definir eleição

Lula fala para a comunidade universitária da USP no prédio da História-Geografia da FFLCH (Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas), na noite da última segunda-feira, 15

18 de agosto de 2022 - 14h24

A distância entre a intenção e o gesto ou porque pesquisa não é eleição

 

Por Maria Caramez Carlotto

Hoje sai mais um Datafolha. Como tem acontecido em outros pleitos recentes, a pesquisa eleitoral tem sido um dos protagonistas da eleição. Mobiliza debates, move estratégias, reorienta comportamentos, divide opiniões. Tudo se passa como se ali fosse um terreno efetivo de disputa.

Como cientista social que gosta e analisa pesquisas eleitorais, fico feliz que se reconheça a importância e a potência das nossas técnicas de pesquisa. Em tempos de negacionismos e, antes disso, de descrédito em relação às humanidades e ciências sociais críticas, acho esse frisson, em parte, bem-vindo. Mas como cientista social que vive a política, tenho o dever de alertar que esse entusiasmo traz riscos.

Pesquisa é pesquisa. Voto é voto. Opinião e ação são dimensões diferentes do comportamento social. Respondem a diferentes motivações e condicionamentos. A distância entre a intenção e o gesto, nesse caso, não é nada desprezível. É um princípio metodológico básico para a ciência social não confundir o que os sujeitos dizem que fazem com o que eles realmente fazem. Tanto que existem instrumentos distintos para investigar essas duas dimensões distintas. Questionários e entrevistas captam opinião; etnografia, observação direta, pesquisa documental e análise estatística captam ação. Instrumentos diferentes para dimensões diferentes.

Prova disso é a comparação entre as pesquisas eleitorais de agosto de 2014 e agosto de 2018 com o resultado nas urnas no primeiro turno, em outubro dos respectivos anos.

Segundo o Datafolha, em 18 de agosto de 2014, as intenções de voto entre os principais candidatos se distribuíam da seguinte maneira:

Dilma Rousseff 36%
Marina 21%
Aécio 20%

O resultado na urna no primeiro turno foi o seguinte:

Dilma 38%
Aécio 30%
Marina 19%

Ou seja, em 2014, muita coisa mudou em pouco menos de dois meses.

Nas eleições de 2018, a diferença foi maior ainda. Em 22 de agosto, segundo o Datafolha, Lula ainda no páreo liderava todas as pesquisas, por uma diferença de 20 pontos considerando-se os votos totais. Mas no cenário que já incluía Fernando Haddad, caso se confirmasse que o TSE (sim, o TSE do discurso inflado de anteontem) impugnaria mesmo a candidatura de Lula (naquele momento, preso em Curitiba), as intenções de voto entre os principais candidatos se distribuíam da seguinte maneira:

Bolsonaro 22%
Marina 16%
Ciro 10%
Alckmin 9%
Haddad 4%

Na urna, em 7 de outubro de 2018, o resultado foi absolutamente diferente:

Bolsonaro 42%
Haddad 27%
Ciro Gomes 12%
Alckmin 4%
Marina 1%

Ou seja, de novo, muita coisa mudou em pouco menos de dois meses.

A eleição de 2022 é diferente? Sem dúvida. A polarização é grande. Há alguma estabilidade no cenário eleitoral nos últimos meses. E o voto parece consolidado, embora menos do que já foi. Tudo isso pode apontar para um resultado na urna mais perto das pesquisas? Pode. Mas isso não invalida, de maneira nenhuma, o princípio metodológico básico: opinião é opinião; ação é ação. Ou seja, pesquisa é pesquisa. Voto é voto.

O que fez a diferença em 2014, 2018 e fará em 2022? Militância. Mobilização. Disputa política. De um lado e de outro. Para brincar com a velha piada: “é a política, estúpido!”.

Em suma, se você quer, como eu, que Lula ganhe essa eleição para impor uma derrota ao bolsonarismo e ao golpismo de 2016, não se entusiasme nem se desespere com as pesquisas eleitorais. Acompanhe, analise, tire conclusões, inclusive para ajudar a orientar a sua militância. Mas não se esqueça, jamais: pesquisa não é eleição e em 50 dias, tudo pode mudar. Como já mudou em outros cenários recentes.

E para concluir, qual a principal conclusão de todas as pesquisas? O resultado segue aberto e quem decidirá a eleição, de novo, são os mais pobres e, para eles, a pauta prioritária, se não exclusiva, são as condições mais básicas de vida. Esse tem que ser nosso foco absoluto. O bolsonarismo vai tentar impor uma agenda moral, religiosa, ideológica. Da nossa parte, é fundamental impor a agenda socioeconômica, material. Em suma, falar da vida que podia ser bem melhor e será (se Lula chegar lá).

E por falar em Lula lá, sábado, dia 20 de agosto, tem Lula no Anhagabaú em São Paulo. Vai estar frio e chovendo. Mais um motivo para todo mundo ir e lotar aquele espaço. Nossa responsabilidade é histórica.

Até outubro.

PS metodológico: para manter a comparabilidade com as pesquisas, considerei para o cálculo dos votos no primeiro turno os votos totais e não os votos válidos de 2014 e 2018. Também arredondei os percentuais.

 

Maria Caramez Carlotto é cientista social formada pela USP (Universidade de São Paulo), possui mestrado e doutorado em Sociologia pela mesma instituição. É professora da UFABC (Universidade Federal do ABC) na área de Relações Internacionais, com foco em Economia Política Mundial, onde coordena o Grupo de Pesquisa Neoliberalismo, Democracia e Mudança Estrutural do Espaço Intelectual Brasileiro e é articulista do Manifesto Petista.

 

 


Comentários

Maria Luiza de C. Guimarães

18/08/2022 - 17h45

Sim. Assim é tb no futebol . Juiz apitou o fim do jogo. As 17:00 hrs do dia 2 de outubro. Confiar mesmo em.pesquisas só no Data toalha! Lula com maioria no Congresso será uma eleição vitoriosa. E a luta continuará.

Zulma Eliana Cunha

18/08/2022 - 17h54

Faz sentido sua reflexão.

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