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MILÍCIA DIGITAL

Bolsonarismo usa redes sociais como máquina de guerra psicológica, alerta analista político

A divulgação de fake news é prática cotidiana do bolsonarismo. Foto: Pedro França/Agência Senado

27 de abril de 2022 - 09h19

Por Igor Grabois

O conflito na Ucrânia se mostra como uma guerra híbrida perfeita. As ações em campo foram precedidas de um maciço ataque cibernético e eletrônico, inutilizando os sistemas de comando e controle da Ucrânia.

Os combates cinéticos – disparos, explosões, lançamento de mísseis – são acompanhados por um intenso combate de informações, tendo como campo de batalha a imprensa internacional e variadas plataformas da internet. A tudo isso se acrescentam sanções econômicas e disputas em torno do sistema financeiro internacional.

A eleição brasileira, em que pese a ausência de tanques e aviões de combate, não será muito diferente. Vivemos em nosso país uma disputa informacional com características de guerra psicológica pelo menos desde 2012.

A disputa de narrativas, com locus nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens, não foi interrompida após a eleição de 2018.

Fake news são apenas uma parte das operações psicológicas em marcha. As redes do fascismo, agrupadas em torno da campanha de reeleição do atual presidente, têm sido bem-sucedidas em criar bolhas e interditar o debate.

Muitas vezes com a ajuda de setores de esquerda que não perdem a oportunidade de cair em uma armadilha digital plantada pelo adversário.

A guerra psicológica nas redes da internet é um desdobramento das operações psicológicas clássicas, aplicadas de maneira sistemática desde a Segunda Guerra Mundial.

A internet consegue ampliar em escala a guerra psicológica, ampliando o público atingido, a quantidade de mensagens emitidas e a velocidade de propagação. Essas características foram exploradas por autores como Andrew Korybko, Gene Sharp e pela tese da “guerra irrestrita” chinesa.

A operação psicológica em rede tem como fase inicial a formação de um público. Esse público precisa ser identificado, ter seus perfis definidos, ser segmentado, por interesses e sensibilidade a determinados temas, e fidelizado.

As senhoras evangélicas serão atingidas por denúncias de incesto, caminhoneiros por conteúdo pornográfico e policiais e admiradores de policiais por glorificação da violência, para ficar em exemplos simplificados.

A fidelização se dará por distribuição maciça de mensagens, transformando os receptores em reprodutores de conteúdos.

A identificação, o perfilamento, a segmentação e a fidelização são feitos a partir da coleta, classificação e organização de grandes volumes de dados, metodologia vulgarmente conhecida por big data.

Como meio é mensagem, vídeos, áudios de internet, textos rápidos, memes, todas essas formas são aplicadas e testadas para os públicos já segmentados.

O Twitter, o Facebook, o YouTube, e agora o TikTok permitem o fornecimento de conteúdos, os grupos de WhatsApp e Telegram garantem a capilaridade.

Uma segunda etapa é o fechamento das bolhas. Os operadores da guerra psicológica sabem que é impossível ganhar o público inteiro.

Os infensos à campanha serão excluídos das bolhas. O objetivo é, a partir da fidelização de uma parcela do público, atingir o setor sem opinião formada.

O setor infenso ao convencimento deve ser excluído. Por isso, o fenômeno de diversas pessoas que não receberam nenhuma das mensagens da campanha bolsonarista.

O fechamento de bolhas visa impedir que o público fidelizado e o público variável a ser conquistado sejam influenciados pelo “outro lado”.

Esse era o objetivo da “campanha se você vota em Bolsonaro, me exclua” no Facebook. A peça principal dessa campanha, levada a termo em fins de 2017, era um meme com um simpático rapaz apontando o dedo para o espectador, com o mote sobre a fotografia.

Bolha não é sinônimo de pouca gente. Bolhas podem envolver dezenas de milhões de pessoas, e mesmo assim ser eficaz em isolar grandes parcelas dos usuários das redes de opiniões e notícias veiculadas em outras bolhas.

Ultrapassar os limites das bolhas, atingir as bolhas formadas pelo adversário é um dos maiores desafios da ação política digital.

Por fim, a ação. O segundo turno da campanha de 2018 foi o exemplo acabado do “bombardeio de saturação”.

Uma grande quantidade mensagens, em todos os formatos, com diversos temas, fake news, distorções e narrativas.

A quantidade de mensagens e a amplitude de sua difusão criaram por si só uma imagem negativa do candidato da esquerda, mesmo que a mensagem isolada não fosse eficaz em si.

A máquina de guerra psicológica do bolsonarismo permanece ativa. A ação nas redes sociais é casada com as famosas lives de quinta-feira do capitão tresloucado.

A operação digital do bolsonarismo não descansou nem um minuto desde a eleição.

As campanhas de desinformação continuam. A falsa dicotomia entre pandemia e economia, o “vírus chinês”, a culpa é dos governadores pelo preço dos combustíveis, os exemplos são inúmeros.

Algumas foram derrotadas, como a campanha contra as vacinas, provando que o bolsonarismo não é invencível nas redes.

O cenário é desafiador. As plataformas são propriedades de empresas estrangeiras que têm suas próprias regras e critérios de governança, engajamentos e tratamento de dados.

Mas a maioria da população está nas redes e quem não está é influenciado por quem está. O Youtube, para ficar em apenas em uma plataforma, tem 127 milhões de inscritos.

A rede não é separada da vida social. Campanhas de desinformação não apagam as contradições da realidade social e econômica.

A agitação nas redes é parte integral da atuação política e eleitoral. Entender as suas regras, mobilizar o nosso público e não fazer o jogo do inimigo são necessidades imperiosas para a atuação política da esquerda.

 

Igor Grabois é analista político e membro do Instituto Mario Schemberg


Comentários

Thereza Martins de Oliveira

01/05/2022 - 18h21

Ótimo texto sobre o tema. Vou divulgar.

Maria Francelina de Sousa

02/05/2022 - 08h23

Ótima informação, dessa forma posso organizar meu raciocínio sobre o que já suspeitava.

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